[ARENA] Actualização do podcast "Conversas Freudianas"

Manuela São Simão manuelasaosimao gmail.com
Quarta-Feira, 17 de Fevereiro de 2010 - 13:58:55 WET


Caro ex-professor de antropologia, muito obrigada pela informação sobre este
assunto
que me interessa em particular, pois vi o filme há pouco tempo e deu-me
muito
que pensar e falar. Vou fazer chegar este e-mail a amigos interessados que
também
não se encontram na dita cuja web social facebookiana. :)

cumprimentos*

2010/2/16 Diniz Cayolla Ribeiro <dinizchess  gmail.com>

> Caros membros do Arena
>
> Gravámos esta noite uma nova conversa freudiana (
> http://web.me.com/machess/Conversas_freudianas/Podcast/Podcast.html) a
> propósito do sonho e de tudo o que isto implica em termos freudianos.
> Por outro lado, o Zé Gabriel escreveu nas "Conversas Freudianas" do
> Facebook um comentário à crítica que Francisco Ferreira publicou no Expresso
> a propósito do filme "Antichrist" de Lars von Trier. Para aqueles que não
> têm Facebook, e eventualmente estejam interessados nesta discussão, coloco
> aqui o dito comentário. E ficamos evidentemente à espera que o citado
> crítico exerça o seu direito de resposta.
> ----------------------------
>
> «De como a seriedade de um filme como o Anti-Christo deixa a nu as
> insuficiências da crítica normótica»
>
> Como sempre que um mesmo estímulo promove uma extrema diversidade de
> respostas, isso permite evidenciar as limitações e as fundações
> ideológicas
> daqueles que reajem. Permite, também, criar um ranking e uma tipologia
> dessas reacções, com ganhos antropológicos, teóricos e práticos, evidentes.
>
> No caso do Anti-Christo, de Lars von Trier, temos, em Lisboa:
>
> Francisco Ferreira (Expresso) - uma bola negra (negativo)
> Mário J. Torres (Público) - uma bola negra (negativo)
>
> Jorge Mourinha (Púlico) - uma positiva em cinco (sofrível)
> Luis M. Oliveira (Público) - uma positiva em cinco (sofrível)
> Vasco Câmara (Público) - uma positiva em cinco (sofrível)
> V. Baptista Marques (Expresso) - uma positiva em cinco (sofrível)
>
> J.Leitão Ramos - (Expresso) - quatro em cinco (muito bom)
>
> Será difícil encontrar um exemplo de maior diversidade avaliativa, para um
> filme que o seu autor, repetidamente premiado, considerou o seu melhor
> filme.
>
> Trata-se de um caso exemplar de filmicídio pela «crítica». Vimos, em
> tempos,
> tentativas ideológicas equivalentes, do salazarismo ao comunismo, à Igreja
> Católica e ao Islão, mas o que interessa aqui é a tentativa de liquidação
> de
> um filme «fora de série» por quem não fez nenhum e se propõe formar a
> a «opinião pública». Para um filme que não alinha no entretenimento, na
> onirização «avatariana» ou no «realismo histórico exemplarista»
> de «Invictus», esta avaliação promove salas vazias e orienta para uma
> retirada precoce de exibição. As grandes distribuidoras só têm a agradecer.
>
> A tipologia que proponho distingue entre «críticos de cinema» (aqui,
> apenas
> um caso, o de J. Leitão Ramos) e «colunistas sociofílicos», em busca de um
> alinhamento popular de sucesso fácil, promotores da produção de um «senso
> comum» mediano, alinhado por baixo, que a «índústria» por certo agradece.
>
> Nos colunistas sociofílicos, apenas há dois graus - o menos um e o mais
> um:
> os «rejeitantes drásticos» e os «rejeitantes moderados».
>
> O vazio entre estes e o «mais 4» (filmofílico prudente»), deixando vazias
> as
> casas intermédias da grelha classificatória, mostra a seriedade de um
> filme
> capaz de «separar as águas» entre quem usa o cinema para ganhar a vida e
> quem serve o cinema como projecto antropológico arriscado.
>
> Vejamos a «justificação» desta tentativa de liquidação não apenas de um
> filme mas, caso mais drástico, de um cineasta de vanguarda, por Francisco
> Ferreira, não só «crítico de cinema» mas, mais do que isso, coordenador da
> página de cinema do destacável cultural do «Expresso»:
>
> «Tudo o que está em causa neste filme relaciona-se com o que é intolerável
> na imagem - e a verdadeira discussão não pode deixar de passar por aqui.
> Mas
> aquilo que de mais penoso se vê em "Anti-Christ - Anticristo", que traz
> selo
> de dedicação a Tarkovski numa afronta injusta e ignóbil, nem merece ser
> nomeado. Seria dar atenção a um cineasta que, de tanto querê-la já provou
> estar disposto a tratar a espécie humana como os nazis a trataram em
> Auschwitz. De resto - já o escrevemos há mais de dez anos, numa altura em
> que o dinamarquês e o seu "manifesto Dogma" eram transformados pela
> crítica
> em coqueluche europeia -, Trier é muito menos um cineasta do que um caso
> clínico de psiquiatria. Voltamos ao intolerável: que imagens são aquelas,
> ao
> ponto de parecer que o filme só existe para elas' A quem se destina aquele
> espectáculo insuportável, a que representação da realidade, a que
> política,
> com que objectivo que não seja o do escândalo?" F.F.
>
> Como se vê, F.F. é um«críitico» intolerante, narcisista, pretencioso e
> autoritário. Ele é que sabe dizer o que é «tudo o que está em causa neste
> filme» e impor qual é a «verdadeira discussão» que «não pode deixar de
> passar por aqui», por onde ele pretende que passe. Ele é que define o que
> é
> uma «afronta injusta e ignóbil a Tarkovski». Ele é que já denunciou, «há
> mais de dez anos» o cineasta como «um caso clínico de psiquiatria» e agora
> se vem gabar da sua superioridade na antecipação de evidências deste
> calibre. F.F. inova e antecipa tempos vindouros. Temos uma nova função
> para
> a elite da crítica de cinema: fazer diagnósticos psiquiátricos, mandar
> internar os casos clínicos (e aqui identifica-se com o psiquiatra do
> filme,
> que afundada a mãe deprimida numa «cura do sono» por tempo indefinido) e
> promover filmes normalizados, ao serviço de realidades e políticas que
> aprove e isentos de «escândalo» (como a Inquisição realizou durante
> séculos,
> em Portugal com o sucesso e conivência que se conhece).
>
> Acusando Lars von Trier de ser um cineasta (ou menos que isso, como vimos)
> que «já provou estar disposto a tratar a espécie humana como os nazis a
> trataram em Auschwitz», F.F. acusa sem provar o que quer que seja, não dá
> um
> único exemplo, uma qualquer referência ou argumento, para além da sua
> evidência de Normopata que pretende eliminar o que, para a sua
> intolerância
> emocionada (e mais em geral, para a dos normopatas para cuja cumplicidade
> pisca o olho, já que sabe que, por definição, apela para a maioria dos
> espectadores) é «penoso» , «insuportável» e «intolerável na imagem» que
> provoca o (seu) «escândalo». Como sempre, a abundância de adjectivos
> punitivos mostra a carência de substância das atribuições.
>
> A acusação de «caso clínico de psiquiatria» tem sido historicamente usada
> pelos poderes quando se querem ver livres de «dissidentes» de uma
> qualquer «normalidade» que se deseja impor com recurso ao senso comum, ao
> partido ou à polícia política. Não se trata apenas de um filmicídio mas de
> um cineasticídio. Se dessem ouvidos na Europa a F.F. (que não parte, que
> se
> saiba, de qualquer competência na área do diagnóstico clínico), Lars von
> Trier teria sido impedido de continuar a filmar e seria internado à força
> num hospital psiquiátrico.
>
> Apelando para uma normose colectiva, F.F apenas pretende rasurar e
> apagar «certas» imagens «intoleráveis», mutilar um filme e calar um
> cineasta. Percebe-se bem o seu inconsciente ansioso, uma vez que o Anti-
> Cristo expõe a ansiedade e a vontade de mutilar e de matar que se move nos
> subterrâneos da «normalidade amorosa», o que o põe fora de si. Teria
> certamente sucesso no Estado Novo, actuando como um Bufo deste «crime» que
> pretende delatar ou como um Censor de lápis azul.
>
> Como censor, F.F. não diz de que fala, a que imagens e escândalo se refere.
> Claro que o Anti-Christo é um filme para adultos que não chamam
> «escândalo»
> a realidades, fantasias, ideologias históricas e fantasmas que adultos
> conhecem e não varrem para baixo do sofá, por mais desagradáveis que
> sejam.
> O recalcamento, a escotomização e a racionalização não melhoram o mundo,
> apenas o oprimem e reprimem.
>
> Face a uma alegoria, F.F. quereria uma «representação da realidade»
> normótica ou meramente sociológica, como no «Laço Branco», a que dá
> «quatro
> estrelas»?
>
> Face à apresentação das contradições antropológicas da modernidade tardia
> (pensada à maneira de Giddens), em que o cognitivismo behaviorista do
> marido
> psicoterapêuta interrompe o sono farmacológico do psiquiatra organicista
> para continuadamente recalcar a análise freudiana da vida onírica, que a
> mulher desejaria, mas que psiquiatras e cognitivistas pós-modernos
> enviaram
> para o Inferno da sua Ciência repressiva, F.F. diz nada, uma vez que ou
> não
> percebe a questão ou está do lado dominante da nova modernidade.
>
> Face à articulação do ginocídio inquisitorial com a tortura do erotismo
> conjugal, uma vez desarticulada a sua superfície aparentemente «normal» e
> provocada a regressão para as suas dimensões «diabólicas», num mundo que
> se
> quer regularizar e normalizar como secular e feminista, livre das «trevas»
> do paganismo, do clericalismo e do analfabetismo, expondo a evidência
> vexatória de que o «progreso civilizacional» não é uma função do progresso
> tecnológico e continua a rebentar no subsolo da guerra dos sexos, a que
> Ibsen e Bergman não viraram a cara, F.F. diz nada. A sua capacidade
> analítica é tão escassa quanto grandiosa é a sua oratória condenatória,
> que
> nenhum Grande Inquisidor se esqueceria de aplaudir.
>
> Face à exposição à regressão para a alucinação, num mundo emocionalmente
> insuportado, e face ao concomitante deslizar do erotismo amoroso para o
> sadomasoquismo e para o comportamento psicopático na micro-escala da
> intimidade e sociopático na macro-escala das ideologias, F.F. prescreve o
> internamento hospitalar das «excepções», visto desconhecer estas
> realidades
> quotidianas, no fantasma e na acção sociopática. Em vez de dialogar,
> analisar e problematizar, diagnostica e elimina como pode do seu pequeno
> mundo cinéfilo aquilo que manifestamente o ultrapassa a ele, uma
> autoridade
> na matéria.
>
> Sintetizando, F.F. deixa a nu como a exposição fílmica das dimensões mais
> extremadas da guerra dos sexos pode levar à exposição jornalística da
> guerra
> dos cineastas e da guerra dos críticos de cinema. E mostra bem como o
> apelo
> desesperado às maiorias morais, normalizadoras e normalizadas, por parte
> de
> um crítico normótico, recorre sem pejo às ferramentas sociopáticas da
> tentativa de liquidação soft de um cineasta que vê o mundo vivido como
> dramático e problemático, para se salientar numa corte de aparências que
> optou jornalisticamente pela «cultura Avatar». JGP Bastos
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