[ARENA] ainda o cão...
João Martins
joaomartins mac.com
Quinta-Feira, 3 de Abril de 2008 - 12:37:34 WEST
Mais aproximado da realidade:
http://abarrigadeumarquitecto.blogspot.com/2007/10/arte-pode-matar.html
João Martins escreveu:
> susana mendes silva escreveu:
>
>> obrigada fernando, mas a história da galeria parece-me bastante
>> romantizada...
>>
> Sobre esta atitude já disse o que tinha a dizer.
>
>> a construção "conceptual" da obra parece-me também fraca, bem como
>> esse simbolismo de substituição:
>> - um cão de rua não é um rottweiler. não representa o mesmo: o da rua
>> é um "pobre coitado".
>> - chamar ao cão faminto o nome do artista morto também é algo que em
>> nada torna a obra mais forte (antes pelo contrário).
>>
> Não me interessaria entrar em detalhe nesta parte da discussão, mas,
> porque o rigor não tem que ser alheio à análise e interpretação,
> pensemos assim:
>
> Natividad Garcia não era um artista. Segundo o que li, há uns meses, era
> uma mulher pobre, da Nicarágua, que foi morta por dois rottweillers
> perante indiferença generalizada.
> O cão que Habucuc expõe, representa, assim, não uma vingança contra os
> rottweillers, mas uma representação da situação, em que uma figura
> frágil, o cão famélico, representa a fragilidade de Natividad e se
> permite ao público da instalação o confronto com a sua própria
> indiferença. Trata-se duma mudança de contexto: uma mulher pobre é
> substituída por um cão famélico, a rua ou fábrica em que Natividad
> morreu, pela sala da galeria.
> Podemos achar essa construção mais ou menos interessante. Podemos sentir
> mais ou menos repulsa pela exploração da imagem do cão famélico, um ser
> vivo em sofrimento.
> Podemos muita coisa.
> Mas sabemos muito pouco acerca de tudo isto. Demasiado pouco para dizer
> tantas coisas, parece-me.
> Eu tenho até dificuldade em imaginar como será a vida na Nicarágua, pelo
> que me é complicado compreender a relevância de determinado tipo de
> intervenções.
>
> Mas concedo que pessoas com maior experiência de vida e mundividência se
> sintam confortáveis a perorar acerca de tudo isto, como se lhes fosse um
> fenómeno próximo.
>
>> talvez algum artista queira fazer uma obra com o habacuc.
>> apanhá-lo na rua e depois logo se via que construção "conceptual"
>> seria interessante.
>> eu proponho, mesmo, que a dita galeria reencenasse algumas partes do
>> "chien andalu" no habacuc!
>>
> É interessante notar que um dos objectivos do artista, presumo, tenha
> sido precisamente confrontar as pessoas com a distorção crescente de uma
> escala de valores em que, de repente, possa parecer normal, comparar o
> valor duma vida humana e do sofrimento humano, como o de Natividad
> Garcia, ao valor da vida e do sofrimento dum cão.
> Não é uma conversa que me interesse por aí além, mas tenho dificuldade
> em movimentar-me em contextos em que a atenção que devotamos aos animais
> de estimação ultrapassa significativamente a atenção que devotamos ao
> vizinho ou concidadão.
>
> Mas se houvesse um mínimo de preocupação com a realidade em tudo isto já
> era muito bom.
>
> João Martins
> http://joaomartins.entropiadesign.org
>
>
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João Pedro Martins
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